Reencontro

17:00


Dia cansativo, meus olhos já começam a pesar. Felizmente o ônibus não está tão lotado. Observo as pessoas em volta, em busca de um lugar vago, até que paro em alguém. Uma garota triste sentada no penúltimo banco. Ela olha para a janela parecendo distante, eu continuo a observar até perceber que já a conheço. Ela se chama Marina, me lembro. Sento ao seu lado. A garota leva um pequeno susto.

-Oi -  cumprimento timidamente, com esperança de que ela lembre de mim.

-Ah, oi Pedro... - ela responde voltando a olhar pela janela. Percebo que os olhos dela estão cheios d'água.

-Ei, o que houve? - Pergunto tocando levemente sua bochecha. Ela se afasta. E permanece calada por alguns segundos. Estudamos juntos há um ano. Agora, a garota mais bonita que já conheci estava estranhamente quieta.

-Nada, estou bem. E você? Soube que conseguiu entrar para Jornalismo. Parabéns! - A mudança repentina de assunto aumenta a minha certeza de que algo está errado. Posso ver em seus olhos que ela mente.

-Sim, passei. Obrigado. Mas... eu te conheço bem Marina... - ela abaixa a cabeça, engolindo também as lágrimas. Seus olhos escuros se voltam para mim novamente. Marina respira fundo e me abraça. O momento dura o suficiente para todas as memórias voltarem fortes na minha mente. E agora, sou eu quem precisa ser forte. Aquela garota do meu último ano do ensino médio, a mesma que me arrancava um sorriso nos dias sombrios, pede ajuda em silêncio.

Ela me encara com seu nariz avermelhado e confessa: -Meu pai... ele... saiu de casa... - para e olha para mim como se pedisse permissão para chorar. - Por minha culpa. - Completa. Ela sempre quis levar o mundo em suas costas. Salvar tudo e todos. Por isso acaba escondendo o quanto é frágil.

-Ei, não foi sua culpa. 

-Eu separei meus pais. Fiz tudo errado. As coisas já estavam ruins...e... eu não passei para faculdade. - A confissão me surpreende um pouco, mas não demonstro.

-Você não tem culpa de nada, Mari. As coisas acontecem, não há muito o que possa fazer. Sei que se esforçou. - Meu ponto se aproxima. Porém, percebo que ela levanta.

-Eu moro na próxima rua. - sussurra.

Só então noto que ela mora a alguns metros da minha casa. Não sei quando tinha mudado. Perdemos o contato pouco depois da formatura, quando ela começou a namorar. Só tenho notícias sua pelas redes sociais. E ela nunca havia me contado sobre a mudança.

-Por que nunca me disse que se mudou?

-Faz só um mês. Quando as coisas estavam ficando feias entre meus pais, viemos morar com a minha tia. - Continuo confuso. - Terminei com o Gustavo também. Acho que tentei fugir de tudo.

Descemos juntos. Paro e seguro-a levemente.
-Você não precisa fugir de mim... - Ela desvia o olhar ao ouvir essas palavras. Me pergunto o que eu perdi. Talvez o medo. Eu sentia algo diferente quando a via, mesmo que em pensamento. E isso, parece não ter mudado.

-Pedro, desculpa. - não consigo entender o que precisa ser desculpado.

-Mari, para. Você não fez nada de errado. Você pode conseguir o quer. Só não terá tudo sempre.

-Não mesmo. O que eu quero? - Pela primeira vez ela sorri levemente ao ver a confusão em meu rosto. - O que eu quero, Pê? Eu não sei. Não tem mais nada que eu possa ter.

Andamos muito lentamente, e sabemos que é proposital.

Ela prossegue: - Eu queria uma faculdade, não consegui. Sempre quis uma família unida...

-Como naqueles comerciais de margarina? - interrompi, arrancando mais um sorriso, dessa vez mais sincero.

-Não, aquilo é falso. Eu queria algo real. Mesmo com brigas, mas com amor. Sabe, amor... Só que é tão difícil achar isso. - Aos poucos não somos mais estranhos, voltamos a ser aqueles amigos do terceiro ano. - Eu tentei procurar isso. Acho que não existe mais.

Acho engraçado. Ela parece uma criança em busca de respostas. Isso existe sim. Eu preciso falar.

-Você está olhando errado. O que acha que é amor? Amor, para mim, existe e muito. Só que ele não tem pressa, não tem hora certa pra se mostrar. O amor se vê nos detalhes da vida. - Percebo que ela está segurando minha mão e observando atentamente o que eu digo. Seus olhos, agora, sorriem pensativos.

-Obrigada. Por me tirar um pouco da minha confusão. - Aperto sua mão em resposta. - Ah, desculpa por fugir de você. Eu só queria um tempo pra não fazer besteira. E tentar acertar um pouco. 

-Não precisa de desculpas. Você sempre acertou. Eu que agradeço, te devo muitas... você que me tirou de algo ruim. - Seu sorriso se ilumina. Acabamos passando da casa da tia dela sem perceber.

-A casa da sua tia não é pra lá?  - Aponto na direção contrária.

Ela para, observa e volta o olhar curioso.  -Você já amou?

Sim, não... que pergunta era aquela? Tem resposta certa pra isso?

-Não sei... o que quer dizer com isso?

-Também não sei, acho melhor voltar.

Ela da um passo, se vira, olha em volta e parti.
                                                                   
                                                                                  -//-
                                                 
Esse é o texto mais longo que já coloquei aqui. Talvez não seja o melhor, mas estou aqui para arriscar e aprender.

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2 comentários

  1. Adorei seu blog!! Amei seu texto!

    Beijos

    http://blogguide4fashion.blogspot.com.br/

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